17 julho 2008

Arte... de verdade

Toc, Toc , Toc...

A mãozinha de ferro bate três vezes na velha porta de madeira. Sempre fechada zelando pelo silêncio no interior.

Aqui fora, rabidantes em pregões cantados alto e bom som... pescadores que concertam as redes frente à baía. Velhos que se juntam, de novo, para mais um jogo de cartas, ou de oril.
Um vai e vem de carros, autocarros, motos, táxis a apitar, sempre! Por tudo e por nada.

A porta abre-se e deixa a descoberto um outro universo...
Ouve-se o sino do espanta espíritos que reaje aos ventos e uma música suave, pouco mais que isso...
O barulho ficou lá fora, talvez por vergonha de entrar num espaço quase sagrado, onde reina uma áurea especial...

Luísa Queirós recebe-nos com um sorriso de quem se importa pouco com a invasão do seu pequeno mundo.
Ao redor um caos em harmonia... Telas por todos os lados, objectos de pintura, tintas, pincéis, livros, pequenos apontamentos de um passado que recorda os tempos em que o Centro Nacional de Artesanato estava vivo, de boa saúde...

Luísa fala desse tempo, e do presente e dos projectos que tem para o futuro.
Fala sem nunca deixar de vestir a sua "noiva" de rendilhados brancos... a noiva que ficara viúva de mais um marinheiro do navio que se afundou... A noiva de vestido imaculado, uma enorme rosa magenta forte e rosto franzido de quem chora compulsivamente a perda... o drama do naufrágio.

Na secretária descansa aberto um caderno de rabiscos. "É o meu dicionário pessoal", afirma Luísa... Uma espécie de transcrição do seu imaginário, dos personagens, objectos e estórias que no momento certo saltam do caderno rabiscado para as telas. "posso reinventar estas imagens vezes sem conta... trabalhá-las até à abstração."

Demorei-me na conversa e na contemplação deste universo fantástico... demorei-me na Noiva, na sua triste história contada numa só tela de 1 por 1 mt.
Um conto "pintado"... conto de tristeza, de emoção, conto de um passado que foi verdade...

Demorei-me enquanto me embalava na cadeira de baloiço, rodeada de obras de arte perfeitas quase sagradas.
Demorei-me nas palavras de Luísa e na viagem mar adentro nesses navios naufragados de outrora...
Poderia ali ficar muito mais tempo. Mas a minha "invasão" dos universos pessoais tinha de continuar...

0 comentários:

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | Macys Printable Coupons